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quarta-feira, 28 de novembro de 2007

A Poeira

Tela James Louis Steg



Logo que cheguei ao campo, quis conhecer o lugar. Fui com o meu cãozinho vira-lata passear pelas redondezas. O esplendor verdejante das árvores ofuscava-me. Subimos e descemos por todos os lugares que não tinham cercas, até que topamos com uma encruzilhada. A terra era batida e vermelha e só de olhar o lugar em volta, quieto, um arrepio percorreu o meu corpo. De repente meu cãozinho assombrou-se com alguma coisa. Um vento levantou uma poeira fina e densa e partículas de pó dançaram rodopiando, levantando folhas secas, arrancadas das encostas de arbustos, que estalavam um som musical de assobio. A poeira fina entrava nos cantos todos. Colava na pele, entranhava nos cabelos que se emaranhavam entrelaçando os fios num trançado louco de carrapicho. Meus olhos se fecharam num desespero de dor, pois tinha sido invadido pela poeira. Era só um cisco, mas valia por mil. Por entre as pálpebras semi-serradas, eu vi, ali de sentinela, no meio da poeirada toda, uma figura desassossegada a medir-me e a rir de meu medo. Eu estava ali, como uma criança apavorada, por não entender de sombras e daquele risinho fino e constante que se mesclava com o vento. A poeira chicoteava o ar, riscava minha pele já toda lanhada. Por medo e precaução sussurrei engasgada: Valei-me meu Deus, abra esse vento e espalha o pó no tempo!

E no meio daquele reboliço, vi com a certeza que carrego comigo, ali no meio de tudo, ele, lindo, rindo para mim, descruzando os braços, que pareciam dar muitas voltas em seu dorso. Foi estendendo lentamente suas mãos de homem. Encolhi-me de pronto e fechei mais ainda os meus olhos que enxergavam mesmo fechados. Quando criei coragem, abri os olhos ainda doloridos pela invasão de poeira e vi naquela desordem de ventos, ele, pinoteando e rastejando no meio de uma labareda de fogo, gritando o meu nome. Colei no chão, paralisada, sem forças nem para respirar. Abri meus olhos que definitivamente se livraram do cisco pelo bafejar daquela coisa estranha que agora era uma nuvem de poeira a se diluir no vento. Foi sendo levado, dançando um balé macabro e no instante exato de seu sumiço, vi o seu pé girando em círculos. Era um casco de bode.

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