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sábado, 19 de janeiro de 2008

O Ladrão

Tela de Tadeusz Makowski


Meu nome é Yliash Zaks e moro em Mazel Tov, pequena aldeia judaica, esquecida nos confins da Sibéria.

Uma vez por semana, vou até Omsk, centro comercial que abastece todas as aldeias do condado. É uma boa caminhada. São duas milhas de suor e desconfiança, pois a estrada toda, é infestada de ladrões que se esgueiram nas quebradas, à espera dos aldeões que trafegam por ali com dinheiro e mercadorias.

Este fato aconteceu quando o meu filho Ytzak estava completando o seu décimo terceiro aniversário e faríamos uma grande festa para comemorarmos o seu Bar-Mitsvá. E por isso, eu estava ansioso para ir à cidade fazer compras para a festa. Era um dia muito especial para todos. Rachel, minha esposa, pediu-me para comprar carne de rena e farinha de matzá para poder fazer todas as delícias que uma “ídichi mama” sabe fazer.

Quando eu já voltava para a aldeia, com meu farnel às costas, vi, ao longe, algumas luzes que se moviam. Parei para observar melhor aquela serpente luminosa a dançar na neve. Ela aproximava-se rapidamente do lugar onde eu estava. Comecei a ficar receoso. Quando vi que todos estavam de preto, com a cabeça coberta e com velas nas mãos, meu coração disparou como o tambor do Rabi quando vê a sacola de coleta se enchendo, na Sinagoga.

O que era aquilo? Não pensei duas vezes para subir numa árvore que estava logo atrás de mim. Aquela procissão sinistra, foi rodeando a árvore em que eu estava e eu fui ficando cada vez mais horrorizado.

Começaram a rezar e a chorar como se eu estivesse morto. Eu tremia tanto que, se não fosse por uma menina gritar, eu ainda estaria anestesiado, completamente paralisado ali.

A menina falou: “O de baixo está bem feio com esses olhos arregalados, mas o de cima... credo! Que horror!”.

Foi quando olhei para cima e vi um cossaco com meio metro de língua fora da boca, toda azulada. Fora enforcado numa corda e dependurado naquela árvore.

O meu susto foi tão grande que despenquei lá de cima, causando a maior confusão. Foi vela voando para todo lado, um corre-corre infernal.

Aquela fila de urubus se desfez, salpicando o campo de neve de pontos pretos e velas riscando o céu de luzes.

Quando eu cheguei em casa, soltando os bofes pela boca, a Rachel já sabia da história. Isso é muito comum em minha pequena aldeia. Toda novidade deixa de sê-la em minutos. Contou-me, morta de medo, que um cossaco, ladrão de Sinagogas, tinha voltado dos mortos e andava atacando os aldeões da comunidade.

Na Sinagoga da aldeia fizemos o Bar-Mitsvá de Itzak a portas trancadas. A sacola da coleta, ficou, o tempo todo, embaixo do traseiro gordo do Rabi apavorado. Para não estragar a novidade e passar por covarde, não contei nada a ninguém.

Fim

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