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quinta-feira, 24 de abril de 2008

Pluma de Anjo

Desenho de Anthony J. Ryder


-Oi Marco! Como vai essa força? Vejo que arranjou emprego neste mercado. Muito bom, hein!

-Pois é, meu camarada! Pra quem estava matando cachorro a grito eu até que estou nadando no mel.

- E o que foi que aconteceu pra você conseguir sair das ruas, companheiro?

-Nem te conto, Pedro. Sabe aquela praça que eu ficava acampado?

-Sei, sim! E daí?

-Foi perto do Natal que aconteceu. Pensei que estava recebendo a visita de um anjo, mas que nada, era uma mocinha, dessas de carinha branquinha e olhos cor de céu. Nesse dia, eu estava todo enrolado num cobertor rasgado e sujo, pedindo a Deus que alguém aparecesse com um pedaço de pão, pois não comia há três dias. Já estava meio verde, varado de fome, quando eu ouvi aquela coisinha linda me chamar: “Hei moço! Você quer um lanche?” Eu abri o cobertor e joguei-o para o lado, dei um pulo e me levantei tão rápido, que a mocinha deu uns passos pra trás. Acho que levou um susto a coitadinha. Quando eu vi o embrulho de pão com mortadela, não resisti, cara. Estiquei minha mão direto pra ele. Nossa, aquilo era fome de leão. Ela deu até risada, do pulo que eu dei pra pegar o embrulho, mas uma belezinha daquela nem imaginava o que seria a tal fome de morador de rua.

-E daí cara, só isso?

-Só isso! Bem se vê que você nunca sentiu fome na vida. Mas, escuta só! Toda a tarde, essa bonequinha me aparecia com um lanche e, assim, sem mais nem menos, ficava conversando comigo. Ela estudava à noite e trabalhava numa loja durante o dia. Morava com uma avó e cuidava da velha e da casa. Podia-se dizer que a menina era um anjo. Acho que essa história de lanche durou mais de um mês.

-Caramba, Marcão, você se deu bem!

-Bem? Pois, sim! Bem mal.

-O que houve, afinal?

-Escuta, só! Um dia ela me perguntou, se eu não gostaria de tomar um banho. Eu nem acreditei no que estava ouvindo. Eu tinha cascão até no olho, cara! Tudo coçava, era horrível. Quem acha que mendigo adora ficar fedendo que nem gambá que morreu, não sabe de nada. A praça só tinha um laguinho com uns peixinhos mixurucas, e era ali que à noite, quando ninguém me via, eu fazia minha higiene, “meia boca”. Morria de vergonha que aparecesse um guarda e me expulsasse dali. O jeito foi ir levando como dava.

- O que aconteceu pra você ficar nessa enrascada, amigo?

-Foi uma calamidade atrás de outra. Roubaram-me os documentos e logo em seguida, perdi meu emprego no Correio, minha vida virou de cabeça pra baixo. A dona da pensão onde eu morava disse que ali eu não pisasse mais os pés e que podia esquecer as minhas roupas, pois iria para um brechó para pagar as despesas.

-Puta que o pariu! Isso é que é dar uma virada na vida. E aí, você foi tomar banho?

-Se fui, é claro que fui. Sai da praça cheio de vergonha, não por mim, mas por ela, que devia estar sem graça por estar andando com um traste sem eira nem beira do lado. Ela morava a seis quadras da praça. Andamos todo o trajeto com ela falando baixinho, como se não quisesse que ninguém soubesse de nosso segredo.

-Que segredo, cara?

- O banho, Pedroca!

-Ah!

-Quando chegamos no prédio onde ela morava, paramos perto da garagem. Ela tinha um plano.

-Essa menina, hein Marcão!

-Pois é amigo, ela tinha um bom plano para me introduzir no sistema!

-Que sistema, cara?

-Oras! Sistema é jeito de dizer. Ela esperou alguém entrar de carro na garagem e enquanto a porta ia fechando lentamente, nós, rapidamente, nos abaixamos e passamos para dentro do prédio. Ninguém viu nada. Subimos pelas escadas, até o segundo andar, onde a bonequinha morava.

-Nossa, cara, tô até arrepiado!

-Arrepiado fiquei eu quando ela me levou até o banheiro e disse: “Tire a roupa!”. Quando eu era mais jovem e cheio de vida, essa coisa de chegar em mulher era mais tranqüila. Eu sabia do meu potencial na hora de conquistá-las, mas ali, naquele estado em que me encontrava, não dava nem pra começar uma conversa. Além da idade, eu era um farrapo humano que se arrastava pela cidade. Era invisível, ninguém me via. Lá na praça, à noite, era tragado pela escuridão do parque e ninguém sabia de minha existência. Por isso, quando aquele anjo apareceu em minha frente, te juro, eu quase me ajoelhei pedindo consolo.

-Nem precisou, ela ouviu o seu coração, amigo!

-Pois sim! Depois que eu entrei no banheiro, fiquei por uns minutos paralisado, olhando todos aqueles potes de cremes e perfumes. Ela me deu uma toalha branca e eu comecei a rir: Pô, toalha branca é brincadeira! Mas que nada, ela me disse que era para eu me sentir um rei, que usasse o xampu, o sabonete e tudo o que eu quisesse. Até escova de dentes nova ela já tinha preparado, e estava ali, pronta para ser inaugurada por mim. Ela mostrou-me como ligar e desligar todas aquelas torneiras e chuveiro e saiu. Disse que estaria fazendo uma comida descente para mim.

-Você tá de brincadeira comigo, não tá?

-Que nada, amigo, antes fosse. Depois do banho, que aliás, tive que tomar mais de três vezes, para conseguir me livrar de todo o cascão acumulado, vi que havia roupas limpas num banquinho. Sai do banho remoçado uns dez anos. Nem me reconheci quando olhei para o espelho. Parecia ter uns trinta e cinco anos. Estava recendendo a limpeza. Até meu comportamento mudou. De humilde, passei a sentir uns comichões de arrogância.
Entrei na cozinha, onde ela preparava um estrogonofe.

-Nossa, cara, adoro estrogonofe! É de um anjo desses que estou precisando.

-Pois esse anjo, depois de me deixar limpinho e sem fome, me mostrou a porta de um quarto.

-Ah! O negócio vai esquentar agora. Conta mais, conta mais!

-Pois, não é que era para que eu entrasse no quarto? Ela me disse que, se eu fizesse tudo direitinho, ainda ganharia a sobremesa. Entrei naquele quarto que nem um lobo que vai atacar uma ovelha. No meio do quarto tinha uma cama de dorsel, cheia de tules e laços. Apesar da penumbra, percebi que havia alguém na cama. Estava nua, me esperando. A roupa que eu tinha acabado de vestir foi retirada num piscar de olhos e em um segundo eu estava em cima daquela cama de princesa. O corpo naquela cama estava fervendo como o meu. Gemeu de prazer como eu que quase gritava de tanto tesão acumulado.

-Cara, você pegou a menina?

-Que nada! Depois que eu me refestelei como um nababo naquele ninho de prazer. Depois de arrancar daquela mulher que estava ali, somente para mim, gritos e gemidos. Senti que de repente ela, depois do último orgasmo, ficou com as pernas e os braços enrijecidos, - como se tivesse levado um choque de dez mil volts. Pulei da cama e me vesti rapidamente. Quando fui acender a luz vi um vulto perto da cortina. Era o meu anjo que ficara o tempo todo ali.

-Com certeza, ficou vendo a performance do mendigo que virou príncipe.

-Isso é que não, amigo! Quando eu acendi a luz do quarto, percebi que a mulher na cama era uma velha, era a avó da menina e o pior: estava morta. Eu tinha matado a velha de tanto gozar. Depois dessa constatação saímos do quarto. Ela me levou até a portaria, agora pela porta de frente. Deu-me a sobremesa prometida, - uma carta de referência para que eu procurasse um seu amigo, dono do mercado em que estou trabalhando agora, mais uma mala cheia de roupas e dinheiro para que eu arrumasse uma pensão. Olhou-me no fundo de meus olhos e disse: “Muito obrigada!”

-Caracas! Você mata a velha e ela ainda agradece.

-Pois é! Foi um caso todo arranjado, desde o começo. E eu estou com pluma de anjo até agora na cabeça.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

O Holandês Voador

Tela de Dino Valls

Estávamos numa escavação no monte Ararates quando se deu o acontecido. Era o fim da tarde e estávamos pensando em nos recolher para a cabana onde guardávamos os objetos resgatados dos sítios arqueológicos, quando, de repente, ouvimos um tremendo estrondo vindo dos céus. Olhei para o alto procurando aquele som terrível e vi uma enorme elipse despencando. Quer dizer, eu pensei que fosse uma elipse, mas era, na verdade, um enorme zepelim prateado. Vinha num rodopio de gases e fumaça, enrolando-se no ar da tarde.


Foi um completo desastre. Vazou óleo combustível por toda encosta, e voou pedaços da nave justamente onde escavávamos. Eu e o meu grupo,
- arqueólogos americanos - pesquisávamos aquele sítio a procura da Arca de Noé. Era um trabalho que vínhamos desenvolvendo há três anos e só recentemente começou a aparecer vestígios da bendita. Estávamos eufóricos e tudo o que acontecia no local achávamos que era um sinal. Corremos até o balão pra ver o estrago, - e que estrago! Eu, muito curiosa, meti a cara no assoalho do zepelim, dependurado, todo retorcido. Quando, sem mais nem menos, despenca um cara todo vermelho do buraco na fuselagem. Foi um estardalhaço. No acampamento estrondeava um alarido da equipe. Queriam saber do estrago e correram, atarantados como um tufão do deserto.


Na noite anterior tínhamos sido atacados por um bando de curdos fanáticos - eu nem sabia que ainda existiam tais pragas no deserto. Só mais tarde me explicaram que, ali, naquelas paradas, quem mandava eram eles. E agora, aquele troço despenca, quase nos matando. - Claro que estou exagerando um bocadinho, pois estávamos há uns cinqüenta metros do local.
O homem caiu desmaiado, de venta aberta e com sangue pra todo lado. Eu, mais do que depressa, peguei minha mochila de primeiros socorros para resolver a questão dos ferimentos, que eram muitos. Do balão, não se salvou nada, aquilo parecia a queda da Babilônia. Todos estavam varados de curiosidade. Quando o homem acordou, soubemos o seu nome. Ele era holandês e se chamava Jeroen Van Der Jamsen. Foi o homem mais feio que conheci em toda a minha vida.


O chefe do grupo de pesquisas, chegou correndo ao sítio arqueológico, apavorado, pensando estar presenciando um fenômeno “ovnístico”. Quando deu de cara com o holandês todo estropiado.
Eu não sei quem levou susto maior, se o holandês de cara talhada à formão, com cabelos vermelhos e todo ensangüentado, ou o chefe sírio-libanês, marrom escuro, cabelos sem corte, barba, que pelo tamanho, nunca tinha visto navalha na vida e os olhos esbugalhados de espanto. Eu que já sabia que o pior já havia passado, vendo a cena, me dobrei em risadas, não deu pra agüentar... pedi desculpas, é claro, mas continuei rindo. O sírio gesticulava tanto que, de nervoso, só conseguia falar em árabe. Com muito custo, foi se acalmando e nos disse: Estava deitado perto das tamareiras, quando tive a impressão de ver riscar o céu, um ovo enorme, todo prateado. Primeiro pensei em me debandar do local, dar um pinote dali o mais rápido possível, mas como não sou covarde, disse pra mim mesmo: Aqui tem macho! Que Alá me proteja! E fui pras cabeças, quer dizer, pro ovo prateado. Imaginei um óvni despencando justo nas escavações. Todos os que estavam por ali, riram do chefe Salim El Salun, - este é o seu nome.

Coitado do Salim, pensou que a pesquisa ia pro brejo do Nilo. Eu, mais que depressa, preparei o narguillé com ervas aromáticas, especiais da casa de Osíris e chá de folhas de hortelã, batizado com algumas folhas de cannabis sativa - não tem coisa melhor para acalmar os nervos. Sentamo-nos em roda, fizemos as apresentações e o holandês, já todo enfaixado com ataduras, nos contou de sua aventura.

Seu pai, o velho ferreiro Geert Van Der Jamsen, junto com sua mulher Matijna, alugaram um pedaço de terra perto do moinho de Martijn Van Menkle, um amigo de infância e começaram uma plantação de papoulas. O negócio foi um achado, sim acharam uma urna enquanto aravam a terra. Dentro dela havia uns papiros escritos em aramaico que deu o maior trabalho para o velho Geert conseguir um tradutor. Levou quase um ano, até que o seu filho Jeroen, sim esse mesmo, o holandês voador chegasse com uma solução.

Ele conhecia uma moça judia chamada Rachel, seu pai era rabino. Moravam em Amsterdã ao lado da Sinagoga onde o pai professava sua fé em aramaico antigo. Era um achado “das Arábias”. Jeroen foi até lá de barco, levando com ele a urna de barro. Falou com Rachel que já o esperava, pois tinham se comunicado por telefone e ela já tinha falado com o pai que além de curioso era um expert em assuntos que não lhe diziam respeito. Então, enquanto o rabino muito feliz com a função de tradutor, desenrolava os papiros em sua mesa imaculada por uma toalha de linho branco. Jeroen e Rachel pediram licença e foram até o centro comercial para tomar um chocomel (chocolate quente). Como estavam considerando aquela data especial, pediram para colocar em cima do chocomel, uma generosa camada de slagroom (nata fresca).

Nem preciso dizer que o nosso holandês estava babando pela Rachel. Para aproveitar melhor aquele momento a sós com ela, propôs irem até uma casa de apostas. Lá, tinha um maluco rifando um balão. Também não vou precisar dizer que o zepelim que caiu sob nossas cabeças, era o tal balão que o sortudo ganhou na rifa.

Quando voltaram para a casa do rabino, encontraram-no desmilingüido no sofá, completamente sem ar. Rachel cuidou do pai com um safanão e o holandês dando outro nela, para que se acalmasse, antes de matar o pai de tanto chacoalhá-lo.
O rabino, depois de tomar um copão de gim, foi, aos poucos, voltando à realidade dos fatos. Os olhinhos de avestruz brilhavam quando começou a contar o que havia decifrado. Bem, na verdade, era uma incógnita dentro de outra. Os papiros diziam que no monte Ararates, dentro da Arca de Noé, havia outra urna, contendo instruções aos homens que sobreviveram às águas de como fazer melhor, essa nova oportunidade que o Criador estava lhes dando. O holandês olhou para o rabino, esperando por mais, mas era só isso mesmo, mais nada. A Rachel olhou para Jeroen de soslaio e sussurrou: O balão!... Jeroen pescou no ar o que Rachel lhe transmitia – “vá de balão até o monte Ararates, pois tenho uma premonição”.

Dito e feito. Depois de uma semana, ele estava com tudo preparado para a partida mais louca de sua vida. O rabino conseguiu o dinheiro necessário, na comunidade de judiaria de Amsterdã e Rachel ficou prometida, desde que ele se convertesse ao judaísmo. Ele dizia que depois que encontrasse a urna, até a Rachel de Jacó se ajoelharia por ele. E numa tarde de março, quando as tulipas estavam em botão, ele, o holandês voador, subiu aos céus da Holanda com um farnel de roggebrood (pão de centeio), queijo gouda e vários uitsmijter (sanduíches) preparados por Rachel, rumo ao monte Ararates.

Depois disso foi o que já sabemos. – a queda do zepelim sob nossas cabeças.
O nosso chefe Salim El Salun, estava com meio palmo de beiço caído. E não era pra menos: primeiro o óvni, depois isso. Acontece que justamente estávamos prestes a desvendar o mais fantástico fato bíblico da história: A Arca de Noé.

Ela que vivia sem futuro, num lugar escuro... estava preste a ser achada por nós. O holandês ficou conosco no acampamento. Ele ainda precisava de repouso e, além do mais, tinha que resgatar os papiros que estavam dentro de alguma urna, ali em algum lugar. As investigações foram aceleradas por conta do holandês que parecia ter mais pressa do que nós. Depois de uma semana de escavações, o holandês, todo eufórico, foi que deu com um pedaço de madeira petrificada. Tínhamos certeza, desde o começo das escavações que a arca estava do lado norte da montanha e não do lado sul. Tínhamos feito um acordo com os curdos, que infestavam a região, atirando em tudo que se movesse num raio de dez metros. O acordo estava sendo respeitado, até então. Acordo esse que era de darmos a eles remédios, mantimentos e combustível. O que estavam recebendo toda semana, sem problemas.

Quando o holandês deu com a ponta da arca, foi um estardalhaço no sítio arqueológico. Salim deu um pinote até o local e de seus olhos saiam faíscas de alegria. Ele sabia que aquilo era algo para se comemorar. O monte Ararates ressoou num brado de esperança e felicidade. Há séculos que se procurava pela Arca de Noé, mas seu aparecimento se dissipava a cada sítio aberto. Eternamente encoberta por camadas de areia, ela dormia, esperando por nós. Nós que ali estávamos, prontos para resgatar seus segredos, desvendar seu interior de mistérios, choramos por tudo o que viria.

Foi um trabalho de mestre a retirada das camadas de areia que embrulhavam a Arca como um papel de seda. Depois de três meses de intenso ir e vir, ela, majestosa, apareceu linda e radiante aos nossos olhos acostumados às descobertas.

O holandês chorou de alegria. Foi ele o primeiro a entrar correndo para dentro da Arca, mas antes, voltou, ajoelhando em agradecimentos. Ela estava intacta, petrificada, mas intacta. Seus compartimentos internos estavam preservados. Achamos vestígios de vidas que estiveram por ali. Salim chorava como um menino. Aquilo nos tornaria muito ricos e famosos. Foi num compartimento estranho, com uma espécie de ventilador que lembrava as pás de um moinho, que o holandês achou a sua urna. Salim lhe disse: Esse moinho estava esperando por alguém como você Jeroen. Só mesmo um holandês para fazer mover este moinho.

Retiraram somente essa urna da Arca, numa operação preliminar no campo de investigação arqueológico. Com o cuidado de estar carregando um tesouro, levaram-na para a barraca de achados. Foi com grande expectativa que ela foi aberta. Ali estava uma lista feita por um sumeriano. Não podíamos mais duvidar que a grande inundação existiu, que aquela região tinha sido coberta por um dilúvio. Claro que a inundação histórica que deu motivo ao dilúvio mítico, não destruiu toda a raça humana com exceção de Ut-napisti, o Noé sumeriano e sua família. Deve ter sido uma das inundações – excepcionalmente grande – que ocorriam periodicamente na região do delta do Tigre-Eufrates. Foram sendo retiradas, cuidadosamente, pequenas placas de pedra, todas escritas numa língua semelhante à dos antigos turcos (turanianos). Estávamos para conhecer às leis que seria o legado da nova raça humana do tronco de Ut-napisti.

Salim trazia com a equipe, o melhor interprete e tradutor de línguas antigas do oriente. Aos poucos, todas aquelas incógnitas letras foram sendo reveladas. E o que soubemos a seguir, nos deixou sem fala. As placas continham os mandamento de Deus aos que sobreviveram ao dilúvio. Solenemente, Salim nosso chefe, se postou ao lado da Arca e leu a tradução das plaquinhas. Chamava-se: “CÓDIGO DE HUMARABI”. Eram coisas simples, perfeitas para se viver em harmonia. Quem seguisse aqueles mandamentos, com certeza viveria melhor e quem sabe, na paz, pois estava repleto de tolerância.

*Nenhum homem fará justiça com suas mãos, nem será seu próprio vingador. Para isso existirá juiz conhecedor do código.
*O médico terá em suas mãos a arte da cura e decidirá quando alguém que sofre pode morrer.
*Aquele que ataca um seu semelhante sem motivo vindo a deixá-lo sem vontade de viver por vergonha do mal cometido terá a “justa paga”, igual ao outro infringido.
*Aquele que ama, poderá manifestar o seu desejo, onde quer que seja, desde que respeite aquele que não o tolere.
* Se a mulher engravidar e se sentir prejudicada com o seu estado, poderá interrompê-lo se assim o desejar.
* Um homem pode usar de drogas que roubam seus sentidos, desde que não fique no caminho de quem está sóbrio.
* Que cada um possa se unir com quem gostar, independente se o outro for do mesmo sexo.
*Ninguém poderá ser importunado por motivos religiosos.
*É proibido adulterar o que foi escrito, de forma que o dito fique pelo não dito.
* Quem acumula muita riqueza, acaba gerando desconforto.

Estávamos todos boquiabertos. O que dizer de tudo aquilo? Então essas leis tinham sido interpretadas e transmitidas como convinha a cada geração. O nono código nasceu para ser desrespeitado. Isso acontece, desde que o mundo é mundo.

Quando terminamos de ler as placas, aconteceu um fenômeno surpreendente nas areias ao redor da Arca. Um vento que não soubemos de onde vinha, revolveu toda a areia que tínhamos retirado para chegar a Arca. Em redemoinho, o vento foi girando em volta dela, com tal força, que nós todos, fomos arremessados para bem longe do local. Depois de tanto girar, ficamos sem saber exatamente, onde estava a Arca. Assim como ela veio, se foi.

Depois da descoberta e do susto, cada um voltou ao seu país. O holandês me escreveu, agradecendo os curativos e disse que vendeu a história do balão que encontrou a Arca, para um jornal de Amsterdã, ficou rico e pode se casar com a Rachel. O rabino tem a sinagoga atolada de fieis, que querem saber sobre a Arca da Aliança e pagam muito bem por isso. Salim não se conformou com o ocorrido e já têm outro grupo de arqueólogos pesquisando no mesmo local. Eu ainda estou tonta com toda essa história do holandês voador. Soube depois, que o significado de Jeroen, quer dizer, “aquele que é sagrado”.